Foto: Paulo Filgueiras/GERJ
As cenas de aposentados aguardando benefícios
previdenciárias em agências bancárias fazem parte do cotidiano do interior do
Rio Grande do Norte. E é este dinheiro que sustenta boa parte do comércio e dos
serviços nos rincões potiguares. Isso se explica pelo fato que a soma dos
recursos para a aposentadoria rural ser maior que os repasses anuais para o
Fundo de Participação dos Municípios (FPM) em 60 das 167 prefeituras
norte-rio-grandenses, segundo dados apurados pela Confederação Nacional dos
Trabalhadores na Agricultura (Contag). A pesquisa produzida pela entidade
rural, a partir de dados coletados em 2018, indica que em 36% das cidades do
Rio Grande do Norte circula mais dinheiro proveniente dos benefícios pagos pelo
Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) – aposentadorias por idade,
invalidez e tempo de contribuição – do que por causa do FPM, a principal fonte
de receitas de prefeituras do interior. A maior diferença entre o que o
município recebe de aposentadorias e o FPM chegou a 736%. É o caso de Pau dos
Ferros, no Alto Oeste potiguar. Em 2018, a cidade recebeu R$ 139 milhões da
aposentadoria rural e R$ 16 milhões do Fundo de Participação.
A diferença superior a 400% entre os valores das
aposentadorias e repasses do FPM também acontece em Apodi (461%), Santo Antônio
(436,4%), João Câmara (430%) e São Miguel (414,1%).
Ao todo, segundo a pesquisa, 30 cidades potiguares têm
uma diferença superior a 100% entre os valores pagos dos benefícios previdenciários
e os repasses federais.
Em 2018, para ratificar a importância dos recursos da
seguridade social para o homem do campo, ao se somar os valores recebidos em
benefícios nos 167 municípios, o Rio Grande do Norte teve R$ 2,9 bilhões. Já
com o FPM, o valor total foi de R$ 2,6 bilhões. Ou seja, uma diferença de R$
300 milhões.
Até dezembro do ano passado, segundo a Contag, o Estado
registrava 271.621 beneficiários de aposentadoria rural. Este impacto
financeiro dos benefícios rurais pode estar com os dias contados. Entidades
representativas dos trabalhadores do setor rural temem que a Proposta de Emenda
à Constituição (PEC) da reforma da Previdência, a PEC 06/2019, possa dificultar
o acesso dos agricultores à aposentadoria, o que acarretaria em graves perdas
econômicas para os municípios. Para se ter uma ideia, em Pau dos Ferros, por
exemplo, que registra 30.183 habitantes, os beneficiários das aposentadorias
rurais representam 42% da população.
“Os pequenos
comerciantes serão os maiores prejudicados com isso. Vai afetar a economia de
vários municípios, e será uma maldade muito grande para os agricultores”,
explica Jocelino Dantas, diretor executivo da Federação dos Trabalhadores
Rurais do Rio Grande do Norte (Fetarn).
Apesar de o relator da PEC na comissão especial da Câmara
Federal, deputado Samuel Moreira (PSDB-SP), ter expressado que os artigos sobre
a aposentadoria rural foram retirados do texto, a Fetarn ainda está receosa de
que a reforma possa recrudescer o acesso aos benefícios.
“Os trabalhadores
rurais sempre foram tratados como servidores especiais. Não precisam contribuir
diretamente para a Previdência. E isso por um motivo simples: pela forma que
eles vivem ou, melhor, sobrevivem”, aponta Jocelino Dantas.
As possíveis novas regras para a previdência rural
delimitavam a obrigação de que os trabalhadores passassem a pagar um valor
mensal de R$ 50. Além disso, o texto prevê que o tempo mínimo de trabalho do
agricultor passe de 15 para 20 anos. “As mudanças não podem prejudicar o acesso
do pequeno agricultor ao benefício”, lamenta.
Governo modificou sistema para os benefícios
Mesmo que a aposentadoria rural não seja contemplada na
PEC da reforma da Previdência, isso não significa que o acesso do agricultor ao
benefício não passou por mudanças. Em 20 de março, através da Medida Provisória
871, os trabalhadores rurais interessados em se aposentar conseguiram o direito
de fazer o pedido sem precisar do intermédio de uma entidade sindical. Os
agricultores podem fazer a declaração de atividade rural diretamente nas
agências do INSS.
Segundo o Ministério da Economia, não será necessário que
a autodeclaração seja ratificada por entidades públicas credenciadas pelo
Pronater, o Programa Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural na
Agricultura Familiar e na Reforma Agrária. Todo o trabalho de exame e
ratificação será feito pelo próprio INSS.
Entretanto, segundo a Fetarn, as entidades sindicais
ainda são necessárias para obtenção do benefício.
“Não é em todo
lugar que tem posto da Previdência Social”, aponta Jocelino Dantas.
Ainda segundo o governo federal, a intenção é melhorar a
gestão do INSS, combater fraudes e irregularidades e reduzir os gastos com o
pagamento de benefícios indevidos. Todavia, na opinião de Jocelino Dantas, a
lei traz uma regra que obriga o trabalhador a comprovar cada ano de atuação no
campo.
“O agricultor mais
vulnerável foi o mais prejudicado. Aquele que não tem terra e que, para plantar
feijão ou milho, atua esporadicamente na área de outra pessoa. A nova lei
endureceu a comprovação de trabalho para estas pessoas. O combate das fraudes
não pode impedir que os agricultores consigam se aposentar”, finaliza.
Femurn defende manutenção de regras atuais
A Federação dos Municípios do Rio Grande do Norte
(Femurn) aponta para a necessidade de manutenção das atuais regras da
aposentadoria rural. A representação das prefeituras potiguares é signatária de
um manifesto da Confederação Nacional dos Municípios (CNM). O documento pede
que os municípios passem a integrar as propostas para o regime geral previstas
na reforma que tramita no Congresso Nacional, sem mudanças na aposentadoria
rural. Segundo a CNM, a inclusão vai reduzir as despesas das prefeituras
brasileiras em R$ 170 bilhões nos próximos dez anos. A entidade também quer a
manutenção das regras atuais do Benefício de Prestação Continuada (BPC) e da
permissão para que os regimes próprios de previdência realizarem empréstimos
consignados.
Fonte: Femurn
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